A proteção que todo trabalhador precisa conhecer
Sofrer um acidente de trabalho é uma experiência extremamente difícil, que pode acarretar consequências físicas, emocionais e financeiras significativas para o trabalhador e sua família. Em momentos de vulnerabilidade, o conhecimento dos direitos garantidos pela Consolidação das Leis do Trabalho e pela legislação previdenciária é essencial para assegurar a proteção do emprego e a estabilidade profissional durante e após o período de recuperação.
Neste artigo, vamos detalhar as circunstâncias que garantem a estabilidade provisória no emprego após um infortúnio, como funciona o processo de reintegração e quais são os direitos trabalhistas e previdenciários fundamentais.
I. Entendendo o acidente do trabalho e a doença ocupacional
Para que os direitos pós-acidente sejam acionados, é crucial entender o que a legislação considera como acidente de trabalho ou doença ocupacional. A Lei nº 8.213/1991 e a CLT garantem ao trabalhador uma proteção especial nesses casos.
A Definição Legal de Acidente
O acidente de trabalho, ou “acidente-tipo”, é definido como um evento que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa, conforme o artigo 19, caput, da Lei n. 8.213/91. Trata-se de um evento relacionado, direta ou indiretamente, ao trabalho executado pelo empregado.
O infortúnio é caracterizado como um acontecimento aleatório e danoso, que deve ser repentino (súbito) – não um processo – e provocar lesão corporal ou perturbação funcional.
As consequências necessárias deste evento danoso, para fins de reparação, incluem: a) Morte; b) Perda; c) Redução; d) Permanente ou temporária; e) Da capacidade laboral.
É importante notar que o acidente de trabalho também pode ter como consequência extrema a morte do trabalhador. Além disso, a lei equipara ao acidente-tipo os acidentes de percurso, que ocorrem no trajeto de ida e volta do empregado para sua residência, e até mesmo a agressão de um colega de trabalho. Outros exemplos de acidentes de trajeto e acidentes que envolvem o ambiente laboral são considerados para efeito de reparação, interpretada a regra pela sua finalidade social.
Doença Adquirida no Trabalho (Doença Ocupacional)
Uma doença adquirida no trabalho significa uma doença contraída no exercício da atividade profissional ou em razão dela, mesmo que o trabalho não seja a única causa. A legislação equipara a doença adquirida no trabalho aos mesmos direitos de quem é vítima de um acidente de trabalho, conforme a Lei 8.213/91.
O surgimento de novas condições globais e a imposição do aumento da produtividade para a redução de custos têm gerado novos impactos sobre a saúde dos trabalhadores. A diminuição nas pausas de descanso e o aumento da carga de responsabilidade têm resultado em verdadeiras epidemias, como as doenças ocupacionais por movimentos repetitivos.
Além disso, estudos da Medicina Ocupacional alertam para o surgimento de outras doenças, muitas vezes pouco especificadas, manifestando-se como graves sinais de estresse ou sofrimento mental. Tais manifestações decorrem das novas exigências impostas aos trabalhadores especializados, que demandam maior atenção e disponibilidade responsável por toda uma linha de produção, um setor de comercialização, um departamento técnico, cultural ou de controle empresarial. Essas novas exigências obrigam os estudiosos a refletir sobre a extensão dos novos processos produtivos e suas consequências para a saúde ou a doença dos trabalhadores.
II. O direito fundamental à estabilidade provisória pós-acidente
A estabilidade no emprego após um acidente de trabalho é uma das garantias mais importantes asseguradas pela legislação trabalhista brasileira.
1. Os Pressupostos para a Estabilidade
Para que o trabalhador acidentado tenha direito à estabilidade provisória pelo período mínimo de um ano, é necessário cumprir dois pressupostos cruciais, conforme detalhado na lei e pacificado pela jurisprudência.
1.Afastamento Superior a 15 Dias: O empregado deve ter permanecido afastado do trabalho por um prazo superior a 15 (quinze) dias.
2.Percepção do Auxílio-Doença Acidentário (B-91): O trabalhador deve ter recebido, em decorrência do afastamento, o benefício previdenciário de auxílio-doença acidentário concedido pelo INSS.
Assim, podemos concluir que nem todo acidente de trabalho garante o direito à estabilidade provisória, sendo indispensável o afastamento prolongado e o recebimento do benefício acidentário. A exceção a essa regra ocorre se for constatada, após a despedida, uma doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego.
2. Duração e Fundamento Legal
A estabilidade está fundamentada no artigo 118 da Lei nº 8.213/91. Essa lei garante a manutenção do contrato de trabalho na empresa por 12 (doze) meses.
Este período de garantia de emprego de 12 (doze) meses começa a contar logo após a alta médica do trabalhador pelo INSS. Essa proteção visa preservar a continuidade do contrato de trabalho, oferecendo tempo para a recuperação física e emocional do profissional.
A estabilidade, portanto, é uma forma de segurança social que protege o trabalhador das consequências econômicas do acidente, preservando seu emprego e fonte de renda.
3. Estabilidade e Exceções: A Justa Causa
Durante o prazo de estabilidade de 12 meses, o empregador está impedido de demitir o trabalhador. No entanto, esta garantia não é absoluta. O empregado não pode ser dispensado sem justa causa.
A lei permite a rescisão do contrato de trabalho em hipóteses excepcionais, como quando há falta grave que configure justa causa, conforme o artigo 482 da CLT. Nesses casos, a empresa tem a obrigação de apresentar provas concretas da infração cometida e deve garantir ao trabalhador o direito de defesa.
III. Suspensão do contrato e direitos durante o afastamento
Quando o trabalhador é afastado por mais de 15 dias em decorrência do acidente ou doença do trabalho, o contrato de trabalho fica suspenso, conforme o Artigo 476 da CLT.
Durante o período de afastamento, o empregado passa a receber o auxílio-doença acidentário do INSS, e não mais o salário pago pelo empregador.
Mesmo com a suspensão, o empregado mantém seus direitos trabalhistas básicos, como a contagem do tempo de serviço.
A Obrigação do FGTS
Um direito fundamental que deve ser mantido pelo empregador durante o afastamento é o recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). O empregador tem a obrigação de continuar a depositar o FGTS durante todo o período em que o empregado estiver recebendo o benefício previdenciário.
É crucial que o trabalhador monitore esses depósitos. Para consultar se o FGTS está sendo depositado, o empregado pode comparecer a qualquer agência da Caixa Econômica Federal munido de sua Carteira de Trabalho e número do PIS, solicitando o “Extrato Analítico do FGTS” ou o faça de forma digital.
IV. A reintegração na justiça do trabalho
Se, apesar da estabilidade garantida por lei, o trabalhador for demitido sem justa causa após a alta médica e durante o período estabilitário, ele pode buscar a reintegração ao cargo.
O pedido de reintegração é formalizado por meio de uma ação trabalhista ajuizada na Justiça do Trabalho. Para isso, o empregado deve comprovar o acidente e o consequente recebimento do auxílio-doença acidentário.
Se o juiz analisar o caso e concluir pela ilegalidade da despedida, ele pode determinar o retorno imediato do trabalhador às suas atividades. Além da reintegração, o juiz pode determinar o pagamento dos salários retroativos correspondentes ao período em que o trabalhador ficou indevidamente desligado, garantindo a manutenção de todos os direitos previstos no contrato.
O Retorno ao Trabalho
Após o retorno do benefício previdenciário e o fim da estabilidade ou após a reintegração judicial, o empregado tem o direito de retomar sua função original ou, se seu estado de saúde exigir, outra função que seja compatível com sua condição física, sem que haja redução de salário.
Essa proteção reafirma o compromisso do ordenamento jurídico brasileiro com a dignidade, a recuperação e o bem-estar dos trabalhadores, fortalecendo o princípio da segurança no emprego.
V. Outros direitos perante o empregador e o INSS
Além da estabilidade e da reintegração, o trabalhador acidentado possui outros direitos importantes tanto em relação ao empregador (indenizações) quanto ao INSS (benefícios previdenciários).
Direitos perante o Empregador
O trabalhador vítima de acidente ou doença do trabalho pode pleitear judicialmente contra o empregador, principalmente:
1.Restituição de Gastos: Cobrança das despesas médicas referentes à doença ou acidente do trabalho, incluindo gastos com medicamentos, próteses e tratamentos médicos.
2.Indenização por Danos Morais: O empregado que sofreu acidente ou doença do trabalho pode pleitear uma indenização por danos morais da empresa.
- Indenização por Danos Estéticos: Em casos de acidentes que afetem a estética do empregado, como a ocorrência de uma cicatriz ou a perda de um membro, o acidentado pode pleitear uma indenização por danos estéticos do empregador.
Direitos perante o INSS
Os principais benefícios do INSS para o trabalhador acidentado ou com doença ocupacional são:
1.Auxílio-Doença Acidentário: Benefício concedido se o acidente ou a doença resultar em incapacidade temporária para o emprego ou atividades habituais, por período superior a 15 dias. Este benefício é pago até que a perícia médica do INSS conclua que o trabalhador recuperou a capacidade de trabalho. Se o trabalhador se sentir prejudicado pela não concessão do benefício pelo perito, deve buscar um advogado para ingressar com ação judicial contra o INSS.
2.Aposentadoria por Invalidez Acidentária: Se a consequência do acidente ou doença for uma incapacidade total e definitiva para qualquer trabalho, o trabalhador passa a ter direito a este benefício.
3.Auxílio-Acidente: Neste caso, o trabalhador retorna à sua atividade profissional, mas permanece com sequelas que reduzem sua capacidade de trabalho. Além do salário recebido da empresa, o empregado recebe este benefício, que possui caráter indenizatório.
4.Pensão por Morte por Acidente de Trabalho: Ocorrendo a morte do trabalhador em decorrência do acidente, seus dependentes passam a ter direito ao recebimento do benefício de pensão por morte por acidente de trabalho.
VI. Recomendações essenciais para o trabalhador acidentado
Para garantir a efetividade de seus direitos perante o empregador e o INSS, é crucial que o trabalhador vítima de acidente ou doença do trabalho adote certas cautelas. Lembre-se, estas recomendações não substituem uma consulta com um advogado de confiança.
1. Arquivamento de Documentos
É fundamental guardar cópias de todos os documentos relacionados ao caso. Isso inclui atestados e relatórios médicos, receitas e notas fiscais de medicamentos, a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), e todos os documentos referentes ao INSS e exames médicos.
É frequente que o INSS solicite a documentação original, por isso é bom tirar cópias de todas as documentações referentes ao seu caso para evitar problemas futuros.
2. Cuidado ao Assinar Documentos
Nunca assine nenhum papel em branco. Essa é uma dica valiosa para qualquer situação. Caso o empregador esteja de má-fé, um documento assinado em branco pode ser usado, por exemplo, para simular o recibo de um valor jamais pago ou, pior, um pedido de demissão.
Se o empregador conseguir que o empregado assine um pedido de demissão, a empresa pode se ver livre da obrigação de pagar o FGTS e os direitos referentes ao período da estabilidade.
Sempre leia com muita atenção todos os documentos que for assinar. Há empregadores interessados em que o trabalhador acidentado peça demissão. Portanto, se houver qualquer dúvida, não assine nada antes de conversar com seu advogado.
3. Comunicação e Provas
A empresa tem o dever de emitir a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) imediatamente, mesmo que não haja afastamento. A falta desse registro configura uma infração.
Se o médico determinar o afastamento do trabalho, é importante levar uma via do atestado médico para o empregador. Se a empresa se recusar a assinar o atestado, o empregado deve procurar seu advogado imediatamente.
Além disso, se você pretende solicitar seus direitos perante a empresa ou o INSS, seus pedidos precisarão ser comprovados. É essencial ter anotado os dados (nomes completos, endereços e números de telefones) das pessoas que sabem dos fatos, que conviveram com você na empresa. No futuro, essas pessoas podem servir de testemunhas e comprovar a versão do empregado.
4. Tenha um Advogado de Confiança
Nunca tome decisões sobre assuntos importantes sem conhecer profundamente as consequências. Por isso, é fundamental estar sempre amparado por um advogado que atue com causas trabalhistas e previdenciárias.
A estabilidade CLT é uma forma de segurança que protege a dignidade e a continuidade da atividade profissional. Se você passou ou conhece alguém que está passando por essa situação, buscar orientação jurídica pode fazer toda a diferença para garantir justiça e segurança no contrato de trabalho.